sexta-feira, 18 de setembro de 2009

A Nova Onda Estatista - Blog da ESTPLAN

* publicado originalmente na Revista Digital (http://www.revistadigital.com.br/)

A questão é profunda. Tem a ver com o que poderíamos chamar de alma do ser humano ou da humanidade.

Até prova em contrário, somos seres contraditórios. Talvez uma mistura de bando de micos barulhentos, com algum gorila eremita. Ao mesmo tempo em que necessitamos nos organizar socialmente, buscamos cada vez mais a consciência do próprio eu; a individualidade.

Sobre essa reflexão não coloco nada de senso moral. Somos o que somos e isso é tudo!

Mas é inegável que os dois extremos (vida social intensa e individualismo extremo) tendem cansar as pessoas. É comum ver mulheres e homens esgotados do stress das grandes cidades decidindo buscar uma vida mais isolada, numa praia ou fazenda, longe do tumulto das metrópoles. Mas na esmagadora maioria dos casos, esse ideal acaba se enfraquecendo em questão de semanas, ou meses. Daí, pinote na direção da cidade... E feliz do caboclo que acaba comprando o sonho alheio baratinho; por uma parcela do que foi investido. Pelo lado dos solitários, eventualmente também há surtos de amor à tribo, o que acaba sendo estressante em pouco tempo.

E essa oscilação entre a necessidade da vida em sociedade e individual é que moldou e continua moldando nossa civilização.

Até pouco tempo, quem estava ganhando terreno era o lado individualista: os casamentos e taxa de fecundidade são indicadores em queda ou desaceleração em praticamente todo do mundo.

No âmbito da economia, esse dualismo é que inspira as paixões por pensamentos socializantes ou individualistas.

Sem grandes teorias, a tradição mostra que as sociedades oscilam entre um ideal e outro em função das circunstâncias: na hora em que fica mais fácil ganhar dinheiro, é cada um por si; mas nos momentos de medo ou dificuldade, uma autoridade protetora do Estado é a pedida mais requisitada.

Mas afora as convicções dos apaixonados pelas próprias idéias - que fazem delas sua razão de ser - as pessoas são mais práticas, balançando de um lado ao outro, de acordo com suas conveniências mais imediatas.

Claro, existem episódios em que o apelo para um ou outro extremo é mais forte, levando a decisões aparentemente convictas, firmes e duradouras.

O desmantelamento da União Soviética tem muita relação com esse tipo de movimento. As pessoas, para serem iguais (socialismo/comunismo), são obrigadas a obedecer regras rígidas que, além de atentar contra a individualidade, são um prato cheio para estruturações burocráticas de rápida esclerose. E a mistura entre ânsia de não perder o poder por parte do exército vermelho e a vodka dentro do corpo de Boris Ieltsin acabaram por provocar a transição quase instantânea entre uma rígida ditadura para a total anarquia... até que a Máfia russa começasse a dar as ordens...

A ascensão de Putin seria uma tentativa de síntese dos dois extremos, com um viés mais para o autoritarismo, secularmente tradicional naquele povo.

Mas em setembro do ano passado começou a tal da crise mundial. Trilhões de dólares foram queimados pelos governos de vários países para evitar um colapso monetário. O preço pago pela travessura da sub-prime foi realmente alto. E não há dúvidas que ficou no ar o sentimento de que a recessão global foi causada por um bando de moleques fora de controle.


A partir daí, começou a crescer a idéia de que os governos dos países deveriam assumir um controle maior sobre o sistema financeiro. Nos EUA e Inglaterra, dentre outros países, vários bancos acabaram sob intervenção governamental. No Brasil, o Bacen praticamente impôs que os bancos privados de maior porte absorvessem seus concorrentes menores.

Tais medidas não podem ser consideradas despropositadas. Mas o problema é que o movimento em questão acabou influenciando a exacerbação de medidas intervencionistas em outros segmentos produtivos.

Não, isso não é algo que esteja restrito ao projeto de poder da esquerda brasileira. Pessoas como o presidente dos EUA, Barack Obama, também estão convencidos de que a autoridade dos governos deve aumentar. E se isso acontece, seja no campo social ou econômico, é natural que a contrapartida seja a diminuição de grau das liberdades individuais.

E essa onda estatista está tomando força em praticamente todo o mundo contemporâneo, na esteira da contabilização dos prejuízos da crise global.

O problema de tal movimento, caso levado de maneira relevante as vias de fato, é que chegará o tempo em que o stress da crise passará e milhões de pessoas buscarão retomar seus hábitos e práticas antigas

Porém, sob muitos aspectos, eles estarão impedidos de usufruir da liberdade com a mesma plenitude do passado.

Afinal, um Estado mais forte cobra o seu preço, seja no cerceamento das liberdades individuais (e econômicas), ou mesmo na redução do direito de propriedade, via estatização ou alta de impostos.

Daí, o pêndulo entre o coletivo e o individualismo começa a pender para o segundo. Os movimentos por maior liberdade ganham força, determinando a custosa tarefa de desfazer o que foi feito para dar força adicional ao Estado.

Moral da história: misturar a necessidade de proteção em momentos de crise, com intervenção nos principais hábitos da vida privada não dá certo.

Entendo que por mais grave que esteja sendo a atual recessão global, ela não pode ser tratada muito diferentemente do que uma grande tempestade, onde as pessoas se juntam em lugares mais protegidos; se ajudam mutuamente na reconstrução do que foi destruído; para depois cada qual seguir seu próprio caminho.

2 comentários:

  1. ótimo artigo, estou pesquisando o associativismo empresarial é exatamente este vies de dualidade que estou identificando em autores das mais diversas áreas (econômica, social, política, cultural).
    Abraço

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  2. Juliana,

    Em vários debates com líderes empresariais, identifico claramente que as decisões políticas do grupo quase sempre são pouco coerentes com os interesses individuais de empreendedor.

    Abraço

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