sexta-feira, 23 de julho de 2010

Os Juros e a Fábrica de Dinheiro

Dias antes de o Banco Central aumentar os juros pela terceira vez consecutiva, os fofoqueiros de plantão do mercado financeiro já antecipavam isso, valorizando a informação como se ela fosse um segredo de estado descoberto através de fontes secretas... e bem perigosas!.

Na verdade, o clima de mistério era apenas dramatização. Os sinais antecipados das autoridades monetárias tornavam evidente que o juro brasileiro iria ser ainda mais turbinado nesse final de julho. Os boatos plantados serviram apenas para esfriar as animosidades dentro daquele conceito do "Ah, eu já sabia".
 
E realmente funcionou. Empresários, trabalhadores, debatedores de boteco e outras categorias que deveriam ficar pê da vida com a situação, mostraram certa conformidade.
 
Entretanto, esse blog não vai deixar de demonstrar sua indignação quanto ao aumento dos juros.  O ato foi desnecessário, pelo menos dentro das justificativas usadas pelo Banco Central. Afinal de contas, o risco inflacionário (centro dos argumentos para alta de juros) é inexistente. Inclusive, os índices de preços estão mostrando tendência de deflação, o que pode ser interpretado como sinal recessivo.
 
Mas então, por que será que os membros do Conselho Monetário Nacional decidiram fazer tamanha maldade com a economia brasileira?

 
Inicialmente, elencaremos três aspectos que podem estar influenciando essa decisão:

1) vale ainda a tese de que a cúpula das autoridades monetárias brasileiras não querem que a candidata governista às eleições presidenciais seja a vencedora. Afinal, subir de juros sem justificativa clara em período de campanha é pedir por favor para perder o governo;

 
2) a gestão das contas públicas brasileiras continua extremamente dependentes do capital externo especulativo. Como em alguns pontos do mundo os bancos centrais mostram sinais de subir os juros, a autoridade monetária de nosso país resolveu sair na frente, oferecendo melhor remuneração aos seus credores para evitar evasão de recursos externos;

 
3) e agora vem a bomba: por algum motivo, a casa da moeda voltou a fabricar dinheiro em ritmo maior do que a necessidade de reposição de cédulas e do crescimento da demanda por dinheiro vivo.

Observando a ilustração abaixo, fica claro que a emissão de papel-moeda nos últimos doze meses está se aproximando de um crescimento de 15% em julho, frente igual período do ano anterior.

Sem maiores delongas, isso significa que as autoridades monetárias estão criando pressões inflacionárias através da emissão. Talvez o governo esteja precisando de dinheiro e venha o fabricando para não deixar escancarado algum aumento de dívida. Mas tal mecanismo acaba pressionando os níveis de preço, sendo a alta dos juros um instrumento para conter a inflação derivada dessa travessura.

 
E na ilustração em questão também fica bastante evidente que existe alta correlação entre a elevação da Selic e a aceleração da emissão de papel-moeda.
Isso fará bem à toda sociedade. O governo é que não vai gostar muito de disciplinar um pouco seus gastos. Mas se os gestores públicos não fizerem isso, quem paga a conta acaba sendo cada um de nós.




Sendo assim, a sugestão dessa sexta-feira é que se mande e-mails para a casa da moeda, pedindo encarecidamente, que tirem o pé do acelerador na fabricação de dinheiro.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Brincando de Céu de Brigadeiro

Tenho um grande amigo que não vou dizer o nome para evitar que ele se torne um inimigo e me processe.

Mas já tem muitos anos que eu o chamo pelo apelido de zebu. E quando isso acontece, ele me olha de forma muito séria e responde com um singelo "mu".

Advogado de formação, o zebu ao qual me refiro teve um sonho na sua vida não realizado: queria muito aprender a pilotar aviões. Mas uma agenda demasiadamente ocupada não permitiu, ainda, que frequentasse aulas de pilotagem.

Com a intenção de provocá-lo, acho que isso faz muito bem para os céus do mundo, uma vez que seu desempenho na condução de carros é lamentável; do tipo que é capaz de transformar, em alguns meses, um automóvel de médio ou grande porte em um carro compacto.

Bem, para saciar seu desejo de pilotar aeronaves, nos últimos anos ele tem se contentado com simuladores de vôo para computadores. Há algum tempo o zebu fez tanta propaganda sobre o hobby, que me convenceu a também comprar o software.

Depois de algumas tentativas frustradas de decolar, pousar, ou mesmo conduzir um avião durante vôo, tive a certeza que a Airbus tem sorte de não me ter como piloto de testes. Só sobraria sucata!
 
Lembrei dessa situação pouco depois de ler várias análises entusiasmadas a respeito do recorde de geração de emprego formal no Brasil no primeiro semestre desse ano.

De antemão, já afirmo ao leitor que tem um pouco de lorota nessa história.

Sim, entre janeiro e junho de 2010, o mercado de trabalho no Brasil aumentou a oferta de vagas em 1,47 milhões de postos de trabalho.


O problema é que a geração de empregos no mesmo período de 2009 foi tão pequena por conta da crise global (menos de 300.000 vagas), que o número subseqüente, após passar da fase aguda do colapso financeiro internacional, só poderia ser espetacular mesmo. Tal contexto não dá mérito algum a uma eventual eficácia de políticas econômicas.

 
Veja na ilustração acima que nos anos anteriores o número de vagas formais disponíveis no mercado de trabalho brasileiro vinha crescendo gradativamente e despencou em 2009.

Para ser bom mesmo, o dado do primeiro semestre de 2010 deveria compensar o fiasco do ano anterior e crescer pelo menos um pouquinho.

Mas o fato se mostra muito diferente. Na média dos dois anos em foco, foram criados 886 mil empregos com carteira assinada, o que é, inclusive, inferior ao resultado de quatro anos atrás, quando a economia brasileira nem estava tão aquecida.

E dentro desse contexto, o que me parece mais comprometedor é que esse tipo de informação distorcida está sendo usada para maquiar uma realidade econômica do Brasil que não é lá muito tranquila.

 
Por isso me lembrei de meu amigo zebu.

O simulador de vôos que ele tanto aprecia tem o poder de criar uma infinidade de faz de conta, em termos de situações que uma aeronave pode enfrentar: desde o tão falado céu brigadeiro, ou até mesmo intensas turbulências.
Mas quando se distorce informações da realidade econômica de um país, as possíveis conseqüências não tem nada de simuladas: se está induzindo ao erro empresas e pessoas bem reais.

 
É lamentável, mas na medida em que as eleições forem definidas e o futuro presidente ou presidenta tomar posse, uma verdade não muito agradável tenderá a começar a aparecer. Mas daí será tarde para que a sociedade brasileira possa debater democraticamente os rumos a serem seguidos.

Afinal, em nosso modelo político, o eleitor só pode intervir na administração pública a cada quatro anos, mesmo que os compromissos assumidos pelo candidato eleito não sejam cumpridos.

Começo a ficar convencido de que um Brasil parlamentarista, onde os governos que não cumprem suas promessas são derrubados, seria, no longo prazo, bem mais saudável para o desenvolvimento nacional.



Curtas

 
Juros em Alta - Pelo terceiro mês seguido a taxa média de juros subiu para as pessoas físicas. De acordo com a Anefac, a remuneração do crédito, em junho, ficou em 6,9% ao mês, o que é equivalente a 123% ao ano. O maior vilão da história é o cartão de crédito, cujos juros analisados chegam a bagatela de 238%. Diante de tais números, é sempre recomendável pensar muito bem antes de se endividar, ou mesmo extrapolar o orçamento mensal.
 
Recorde Tributário - No primeiro semestre a arrecadação de impostos federais chegou a R$ 382,9 bilhões, o que é o maior patamar de receita pública obtida na história do Brasil nesse período. Os tributaristas de plantão justificam esse resultado a patir de uma composição de fatores que incluem fim do benefício de IPI para vários produtos, melhoria da fiscalização e outras medidas que descaracterizariam o aumento de carga tributária. Pura mentira: a conta é muito simples. A arrecadação aumentou 18% em comparação ao primeiro semestre do ano passado, enquanto o PIB subiu 9% (por conta da base comparativa deprimida). Ora, se o dinheiro destinado aos cofres públicos aumentou mais do que o crescimento da economia, é lógico que a carga fiscal cresceu. E mente quem diz o contrário. O pior é que esse dinheiro não vai melhorar a qualidade dos serviços públicos; só vai deixar a conta bancária de cada um de nós mais pobre...

 
Reforma Financeira nos EUA - O Presidente norte-americano ainda deve estar festejando a última vitória política, ao aprovar no Congresso sua proposta de reforma financeira. A nova Lei, com duas mil e tantas páginas, torna bem menor a liberdade dos bancos para assumir riscos empresariais. A nova regulamentação é a resposta do Estado ao trauma que ficou das trapalhadas dos financistas, o que acabou desencadeando a crise iniciada em 2008. Porém, se a dose de engessamento for excessiva, os EUA podem estar prestes a dar adeus à característica mais marcante do sucesso econômico do país: a coragem para assumir riscos empresariais; a liberalidade de falir e aprender com os erros para se levantar de novo e ter sucesso. Bem, cada povo com as suas decisões...


terça-feira, 6 de julho de 2010

A Maldição da Bolsa de Valores

Imagine o seguinte: em fevereiro de 2003 você chegou das férias e gastou bem abaixo do esperado. Sem saber direito o que fazer com dinheiro que sobrou, resolve ouvir o palpite de um amigo e investir na bolsa de valores R$5.000,00.



E não precisando do dinheiro, acaba deixando aquela aplicação de lado, até esquecer da sua existência. Mas lá por março de 2010, depois de anos, você presta atenção a um pequeno envelope que chega pelo correio. É o extrato da corretora de valores, informando os lucros de investimento na bolsa para fins de imposto de renda. Uma feliz surpresa: estava a sua disposição pouco mais de R$23.000.

Como fizemos esse cálculo descontando a inflação, o valor sobe o qual estamos tratando é real. Ou seja, em sete anos a rentabilidade do índice Bovespa foi de 366%, sendo isso equivalente a um ganho médio de 24,6% ao ano. Provavelmente, nem com a agiotagem se ganha tanto dinheiro.

Diante dessa simulação, baseada em um contexto econômico real, é importante questionar qual a base de sustentabilidade de resultados tão espetaculares do mercado de ações do Brasil. De antemão, já dá para descartar da imaginação a idéia de que as empresas brasileiras de capital aberto cresceram o dobro da economia chinesa nos últimos sete anos.

Aparentemente, o fenômeno em questão foi ocasionado por quatro fatores principais, quais sejam:

1) a eventual eleição de Luís Inácio da Silva era vista como forte risco empresarial no Brasil, haja vista o discurso de estatização que predominava (e ainda predomina) no âmbito das lideranças do Partido dos Trabalhadores. Mas o então novo presidente optou por garantir a legitimidade do mercado privado e isso aumentou a confiabilidade do mercado de ações, que acabou recebendo mais investimentos já a partir de 2003;

2) o dinheiro no mundo ficou muito barato e os aplicadores buscaram alternativas mais rentáveis do que investir em títulos da dívida de países com boa situação financeira. O Brasil foi uma das nações premiadas com esse tipo de especulação, que acabou multiplicando a movimentação do mercado de ações;

3) através de competentes campanhas, a bolsa de valores de São Paulo perdeu seu ar aristocrata e passou a ser mais acessível à classe média, seja via corretoras e bancos, ou mesmo pela Internet. Evidentemente, com mais pessoas dispostas a investir, o preço das ações subiu acima das expectativas da evolução do valor patrimonial das empresas;

4) especialmente entre 2006 e 2008 (mas também no final da década de 90) o equivocado consenso de que a economia mundial passava por uma nova era; de crescimento acelerado e eterno, acabou criando o que se chama de bolhas especulativas, aumentando demasiadamente o valor das ações. Tais bolhas estouraram nos principais mercados do mundo; mas no Brasil ganharam sobrevida ou se recuperaram mais rapidamente em função dos outros três fatores mencionados.

Mas, enfim, independentemente se foram por razões consistentes ou mero ilusionismo, o fato é que o índice Bovespa acabou se acelerando em demasia e pelas suas características cíclicas, conforme demonstra ilustração abaixo, tende a registrar sensível recuo, antes de nova fase de expansão.



Na verdade, a crise global iniciada em setembro de 2008 chegou a promover tal correção de valor. Entretanto, o poderio especulativo foi forte o suficiente para reverter a situação.

Com o recrudescimento da crise na Europa, além de incertezas no cenário econômico mundial e brasileiro, o iBovespa fechou junho em baixa, tendência essa que continua em julho, apesar do pregão ter fechado em alta nesse dia 7.

Talvez estejamos em meio ao começo dessa correção cíclica para baixo, ou o fenômeno demorará mais algum tempo para ocorrer.

De acordo com os parâmetros identificados nas situações similares ocorridas anteriormente, o "fundo do poço" tende a estar ao redor dos 45.000 pontos.

É esperar para conferir!

 

Curtas




1) Todos os indices de preços ao consumidor mostram que a inflação que causou duas altas consecutivas da SELIC simplesmente se evaporou junto com a água do excesso de chuvas no sul e sudeste. Comprovadamente os membros do Comitê de Política Monetária do Bacen estavam errados, ou não querem Dilma Rousseff na presidência do Brasil.