sexta-feira, 21 de maio de 2010

Brasil paga pela Crise Grega

Nessa última quinta-feira, o mercado financeiro global viveu mais um daqueles dias perturbadores. As principais bolsas de valores seguiram em queda, enquanto a moeda européia continuava a perder valor frente ao dólar.

Como se sabe, a raiz dessa nova crise está no escancaramento do caos fiscal na Grécia e, em menor gravidade, em Portugal e Espanha.

Mas essa questão ganha mais importância do que o peso econômico dos três citados países na medida em que ela externa uma situação de inconfiabilidade que pode se generalizar pelo planeta.
 
Relembrando, a crise iniciada em setembro de 2008 era de cunho financeiro. Mas para evitar um colapso econômico, os bancos centrais injetaram dinheiro no mercado, bem acima das suas possibilidades normais.

Claro, tal situação aumentou o endividamento das principais moedas do mundo (dentre as quais o euro), ao mesmo tempo em que os juros baixavam para incentivar o consumo.

Em outras palavras a situação é mais ou menos como emprestar dinheiro a juros menores para quem está com maiores chances de quebrar. É um contra-senso, mas isso foi feito para tentar livrar os principais países do mundo de uma grande depressão.
 
E com tal risco em alta, bastou o governo grego admitir estar na pindaíba para que a desconfiança geral aumentasse. Daí começou a corrida dos especuladores para retirar seus investimentos em ativos de menor garantia. No caso, o euro começou a derreter diante do dólar (não tão fortalecido assim), enquanto as aplicações em bolsas de valores também enveredavam para seguidos pregões de baixa.

Mas o que tudo isso tem a ver com o Brasil?
 
Para começar, nosso país não é mais apenas um ilustre desconhecido nas relações internacionais. A posição de grande produtor de commodities e minerais, além da competitividade em alguns segmentos de indústrias, colocam o Brasil dentre as principais economias do mundo, com um mercado consumidor de tamanho bastante respeitável.

Mas acima de tudo, o que chama a atenção para este vasto território da América do Sul é o fato de nosso Banco Central premiar os investidores estrangeiros com as maiores taxas de juros do mundo há mais de 15 anos (com algumas semanas de excessão).

O problema é que ninguém com a cabeça no lugar esquece daquela velha regrinha de mercado: quando a esmola é demais, o santo desconfia. E assim, nos momentos de turbulência internacional, é natural que o mercado financeiro do Brasil acabe sendo mais prejudicado por instabilidades do que os países desenvolvidos, mesmo que as encrencas ocorram por lá.
 
Veja a próxima ilustração. Quando estourou a crise financeira global, em setembro de 2008, o Ibovespa simplesmente despencou, fazendo com que as ações brasileiras tivessem seu preço médio reduzido a mais da metade no período agudo da confusão. Mas a desvalorização das empresas também ocorreu nos principais mercados do mundo, se bem que em patamares mais moderados.
 
Porém, nesse mesmo período, que vai até o final do primeiro trimestre de 2009, às principais moedas internacionais chegaram a se valorizar entre 30% (euro) e 70% (Iene) diante do real.

Fica, então, a indagação: se o Brasil estava fora do eixo mais intenso da crise internacional, por que a moeda do país se desvalorizou tanto?

É verdade que o real estava e está sobrevalorizado. Mas a situação não teve relação alguma com a eventual tomada de consciência do verdadeiro valor da moeda do país. A questão foi muito mais simples: os investidores externos resgataram suas aplicações financeiras e investimentos na bolsa brasileira, seja para cobrir prejuízos em outras praças, ou para fugir de situações de maior risco, expressas por juros várias vezes mais elevados do que a média mundial.


Com o arrefecimento dos ânimos a partir do segundo semestre de 2009, a confiança no Brasil foi gradativamente sendo restabelecida, com a bolsa de valores recuperando o nível anterior ao estouro da bolha especulativa e o real ( via entrada de aplicações estrangeiras) voltando a patamares de supervalorização, para a tristeza dos exportadores e alegria daqueles mais chegados a produtos estrangeiros.

Daí vem a Grécia e reaviva a fogueira da crise internacional. A motivação financeira acabou cedendo espaço para os buracos das contas públicas dos países europeus e, indiretamente, os EUA, que continua a conviver com déficits públicos gigantescos.

E por conta disso, a ilustração a seguir mostra a queda do índice Bovespa sendo acompanhada pela desvalorização do Euro, mas de forma mais branda.
 
O problema é que a situação detonada na Grécia não tem aparentemente nenhuma culpa de fazer com que as demais moedas importantes do mundo ganhassem valor diante do real.

O iene, o iuan e o dólar (escondido, na próxima ilustração, atrás da linha do iuan, pelo fato de as duas moedas estarem inquestionavelmente atreladas) acabaram se valorizando por conta de situação análoga à verificada em 2008: em momentos de turbulência, juros mais altos voltam a representar maiores riscos.

Uma outra forma de ver a questão: o Brasil remunera mais generosamente os investidores estrangeiros, porque está precisando mais de dinheiro do que os outros países. E quem se encontra em tal situação, evidentemente tem chances maiores de, diríamos, falhar com o pagamento. E a resposta dos investidores diante desse quadro é o notório "pernas para que te quero".


Afora isso tem um outro aspecto interessante a se identificar na atual conjuntura de crise.
Acompanhando a próxima ilustração se observa que junto com Brasil, a China vem registrando as quedas mais intensas na bolsa de valores. As praças de Londres, Tóquio e Nasdaq também recuaram, mas de forma menos intensa.

Interessante: o Brasil quase não tinha títulos podres (sub-prime) em setembro de 2008 e acabou penando com a crise especulativa. Agora, não há muitas ligações expressivas entre economia de nosso país e a grega. Mesmo assim, as empresas brasileiras perderam mais valor do que as de países enterrados até o pescoço nas causas da instabilidade internacional.
Moral da história: mesmo não mostrando aparentes sintomas de problemas sérios, a confiabilidade da economia brasileira é ainda menor do que a de nações em situação mais próxima às raízes da crise internacional.

Como isso se explica? EUA, Grã-Bretanha e Japão têm vários laboratórios, centros de pesquisa e universidades que garantem o surgimento de produtos inovadores no mercado, sendo essa a maior fonte impulsora do desenvolvimento. Além disso, predominantemente, esses países têm a tradição de disciplina fiscal (lembrando que o buraco orçamentário norte-americano foi causado pelo governo Bush, exceção à regra das últimas gestões do executivo do citado país).

De acordo com o exposto não fica difícil receitar o caminho para que o Brasil deixe de pagar o pato pelas travessuras gregas, ou de qualquer outro país: a chave da questão está na sustentabilidade econômica.

Isso significa resolver o nó górdio do déficit público nacional, para poder baixar juros de forma relevante; e investir prioritariamente o dinheiro público em frentes geradoras de riqueza, como laboratórios, escolas, infra-estrutura e outras alternativas do gênero.

 
Curtas

1) preste atenção na mutação genética em bactérias a partir da criação de células com genoma sintético. De uma forma simplificada, os cientistas norte-americanos que fizeram isso deram um passo fundamental para criar e moldar a vida em laboratório. Além de mandar dogmas religiosos fundamentalistas para as cucuias, essa revolução do conhecimento abre enorme leque de possibilidades para o futuro da humanidade. Cura de doenças, despoluição e outras coisas legais podem ser facilitadas. O problema é que tal conhecimento pode acabar causando alguns acidentes...

2) até o final de 2010 a google estará lançando a Internet por TV. As redes de telecomunicações que se cuidem, pois essa inovação pode vir a transformar completamente as regras do mercado.


terça-feira, 18 de maio de 2010

A Encrenca Industrial Brasileira

Quando se imaginava que o pior da crise global já havia ficado para trás, eis que a irresponsabilidade fiscal da Grécia acordou o mundo para os graves problemas por que passa a União Européia.

Em resumo, o euro enfrenta a mais séria crise de confiabilidade de sua curta história, podendo, segundo o posicionamento de alguns países a ele ligados monetariamente, ser extinto e substituído pelas moedas originais das nações integradas.

Mas essa é uma questão que iremos discutir mais aprofundadamente nos próximos dias. O que importa, no momento para a presente análise, é que as medidas necessárias para tentar salvar a moeda européia tendem a ser recessivas, o que pode jogar um balde de água fria nas perspectivas de recuperação do comércio global.

Indicadores mais claros nesse sentido só estarão disponíveis a partir de junho ou julho. Mas a questão em si instigou a curiosidade para saber a respeito da situação das exportações brasileiras nesse contexto inicial de recuperação, após a brutal crise financeira detonada em setembro de 2008.

Porém falar de comércio exterior no Brasil não é algo muito simples. A economia nacional, mesmo não sendo caracterizada como desenvolvida, é diversificada o suficiente para ter várias especialidades potencialmente competitivas no mercado global.
 
É lógico que o leitor de um blog não espera uma análise exaustiva; mas sim algo resumido que dê uma idéia geral da situação em foco.
 
Assim, a ilustração a seguir mostra a evolução recente das exportações brasileiras em doze meses, segmentada em três níveis: produtos da base do agronegócio; minerais e mercadorias da indústria de transformação.

Não é novidade a grande ascensão agroindustrial do país no mercado internacional (linha azul). Entre dezembro de 2007 e o mesmo mês do ano seguinte as exportações do setor aumentaram 26%, desbancando a indústria de transformação da posição de liderança na geração de divisas para o Brasil.

A crise gerou, em termos anualizados, um impacto até que modesto no perfil de internacionalização dos produtos de base rural. Em novembro do ano passado a retração em doze meses, diante do melhor resultado já obtido (nov/08) chegou a 8,3%; e o dado de abril último revela uma defasagem de apenas 4%. Tais dados indicam uma atuação setorial amadurecida, com clara estratégia de sustentação parcial do valor dos produtos em foco, mediante o controle da oferta.
 
O caso dos produtos minerais (linha vermelha) mostra, ainda, os produtores brasileiros como os elos mais fracos da cadeia produtiva em questão. A crise global fez o preço médio dos minérios desabar 41%. Em valores, a retração chegou a 31,8% (comparação entre novembro de 2009 e o mesmo mês do ano anterior), sendo que em abril, a defasagem diante do apogeu se mantinha ao redor de 23%.

Por fim, a situação da indústria é a mais lamentável. O setor perdeu a hegemonia exportadora do país entre setembro e outubro de 2008. As vendas externas chegaram a despencar 30% (até dezembro/09) e mesmo com a recuperação dos últimos meses a defasagem continua em 25%.
 
O problema é que esse desempenho não é explicado somente pela crise internacional. Os dados analisados da produção industrial do país mostram que a despeito de resultados animadores no primeiro trimestre do ano, as fábricas ainda apresentam uma performance estagnada na medida acumulada em doze meses.



E a recuperação de tal situação não é lá muito simples. Além do menor apetite por compras do mercado internacional, o Brasil se depara com três problemas da maior gravidade.

O mais óbvio deles é o câmbio, que para gerar competitividade exportadora aos nossos gêneros industriais mais tradicionais deveria estar diante do dólar (incrivelmente voltou a ser a moeda forte do mundo, pelo menos nestas semanas) em uma paridade próxima a R$2,35.
 
Um pouco menos óbvio é o custo direto e indireto que o nosso país paga a mais pela ineficácia do sistema logístico. Estou falando de transportes internos ainda caros e lentos; além de terminais de carga aéreos e navais ineficazes e insuficientes para as demandas globais mais ágeis.

Por exemplo, se um pequeno importador resolver comprar uma quantidade modesta de produtos da China, no máximo em duas semanas, a mercadoria estará disponível para o comprador, caso não haja problemas de embaraço aduaneiro dentro do próprio Brasil. Por outro lado, de acordo com depoimentos próprios empresários exportadores, é algo inomum as encomendas industriais brasileiras honrarem prazos, especialmente por conta da falta de opções logísticas eficazes em termos de embarque e linhas comerciais de entrega partindo do Brasil.
 
Por fim, deve-se reconhecer que a base científica e de capacitação industrial do país não vem evoluindo como deveria. Nos portfólios dos distribuidores internacionais, afora algumas exceções, os produtos brasileiros aparecem como sendo de segunda ou terceira categoria; um pouco acima dos chineses, mas muito mais caros.
 
De acordo com esse quadro, além de uma espera, talvez mais longa, para o final da crise econômica mundial, o Brasil tem a obrigação de cumprir uma agenda bastante pragmática para recuperação da competitividade industrial.

Inicialmente, enumeramos três pontos para o cumprimento dessa missão:

- processo de recuperação cambial a ser obtido pela redução do grau de dependência do país do capital especulativo externo (para isso será necessário melhoria do desempenho das contas públicas);

 
- a modernização dos aeroportos e portos, sem dispensar a formação de uma marinha mercante que beneficie logísticamente o país (em tempo: isso não se fará pelo anacrônico e condenável fundo da marinha mercante);

- e, finalmente, a formulação de uma política industrial brasileira realmente séria, onde os segmentos fabris a serem apoiados sejam realmente apoiados com verbas para desenvolvimento científico; priorização de ensino técnico; e completa desoneração tributária para exportação; além de programas de desenvolvimento de credibilidade no mercado internacional.
 
Não digo que tal caminho seja apenas uma questão de pegar e fazer. A burocracia brasileira tem labirintos muitas vezes intransponíveis até para os líderes mais influentes e persuasivos.
 
Sendo assim, já passou da hora de se fazer uma grande faxina burocrática no Brasil. Que se re-escreva o código tributário; a Constituição; se acabe com os cartórios; modernize as aduanas; e se priorize verbas fiscais e pára-fiscais para ações de efeitos realmente pragmático voltados à melhoria da competitividade industrial.
 
Tal caminho foi adotado por países como China e Índia. A situação brasileira está mais perto da Rússia, onde o faz-de-conta é camuflado pela comercialização de recursos naturais.

O candidato à presidência que se comprometer com tal plataforma mereceria atenção da população.



CURTAS

• De acordo com dados divulgados hoje pela receita federal, a arrecadação de impostos fechou abril em R$70, 9 bilhões. Esse valor é um recorde para o mês, superando em 16,8% o resultado do mesmo período do ano passado. Com relação ao primeiro quadrimestre, a alta já está em 12,5%. Sem dúvida esse é um movimento claro de recuperação da carga fiscal, turbinado pelo final da redução do IPI em segmentos como automotivo, imóveis e eletroeletrônicos. O problema é que tal resultado tem cunho imediatista. Dados da Anfavea já mostram queda da produção de automóveis de 14,6% em abril último diante de março. Alta de juros, misturada com majoração de impostos pode acabar sendo uma alquimia explosiva para a atividade econômica.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Desmistificando a Inflação de Demanda

A verdade é que as contas públicas do governo federal andam meio na pindaíba mesmo. Nos últimos anos a administração pública pisou fundo nos gastos com o aumento do quadro de funcionários e outros custeios. Porém, com a queda da arrecadação a partir do final de 2008, começou a faltar dinheiro para pagar a conta, sem aumentar o endividamento.

A situação é grave e já há quem fale que o futuro presidente receberá de presente - no início da sua gestão - uma crise fiscal de grandes proporções.

Entretanto, admitir isso seria suicídio político. Dessa forma, o ministro da fazenda, Guido Mantega, tem lá seus motivos em anunciar que o corte de gastos de R$10 bilhões é uma maneira de conter o crescimento exagerado da economia brasileira, evitando a inflação de demanda.

Mas que raio de crescimento exagerado é esse? Primeiro usaram a inflação temporária dos alimentos, das matrículas e dos ingressos de futebol (veja postagem de ontem) para subir juros. Agora, aparentemente o campo está sendo preparado para nova alta da SELIC por conta do aumento das vendas do comércio varejista ampliado, de 22% em março último frente ao mesmo mês de 2009.

O número realmente é de dar gosto. Os destaques foram os segmentos de veículos (32%), material de escritório/informática (35%) e móveis/eletroeletrônicos (25,7%).

Coincidentemente, esses três gêneros do comércio foram beneficiados com redução de IPI no decorrer do ano passado e, especialmente, no ramo automotivo, o apelo comercial de que o benefício fiscal estava com os dias contados, realmente funcionou de forma primorosa.

Mas com raras exceções, somos obrigados a admitir que as lojas estão em um momento bastante animador. Na composição dos últimos doze meses, o setor teve crescimento de vendas de 9,6%, a despeito do resultado negativo do material de construção e expansão muito modesta da venda de combustíveis e produtos do vestuário.

Seria esse, então, mais um ponto a favor da tese do ministro da fazenda? De jeito nenhum!

A inflação de demanda ocorre quando se configura o que os economistas chamam de conflito distributivo, ou seja: a situação na qual a capacidade de produtiva é insuficiente para ofertar a quantidade de produtos que a sociedade quer consumir.

Daí, em tese, os preços sobem para equilibrar oferta e demanda.

Mas é algo estranho pensar que o Brasil de hoje possa estar enfrentando esse tipo de problema. A despeito das chuvas catastróficas dos últimos meses, nosso país é um dos maiores exportadores globais de produtos primários, havendo, estruturalmente, comida de sobra.

E pelo lado industrial a situação é mais inacreditável ainda. A próxima ilustração mostra, desde o início de 2008 (portanto antes da crise mundial), a evolução da produção física da indústria e das vendas varejistas em doze meses.

Interessante é que o comércio, nesse período, sempre se manteve em patamares de desempenho sensivelmente superiores ao das fábricas que inclusive, até março último, ainda não haviam encerrado a recessão iniciada no começo de 2009. Ora, se a produção cai isso quer dizer que as manufaturas ainda estão com capacidade ociosa, tornando impossível existir inflação de demanda real.

Para esclarecer: a sustentação dos resultados do comércio está ligado às importações de bens de consumo, que vem se mantendo em alta, a não ser por um curto período entre setembro de 2009 e fevereiro de 2010 no âmbito dos produtos duráveis, por conta da elevadíssima base comparativa do ano anterior e a estocagem de produtos (questão de oportunidade cambial).

Quando a indústria brasileira estiver com crescimento anualizado beirando os dois dígitos e o comércio sustentar o mesmo ritmo, aí sim poderemos começar a conversar a respeito da inflação de demanda.

O problema atual, que leva ministro da fazenda a cortar o orçamento ( apesar da insistência em ressuscitar a Telebrás) chama-se desequilíbrio das contas públicas. A indústria é onde mais se concentra a carga tributária brasileira; e a recessão do setor, imposta em muito, pelas dificuldades cambiais (que facilitaram as importações) é que acabaram minando as pretensões de gasto do governo federal, obrigado a cortar custeio.

A solução de curto prazo para esse problema é simplesmente tornar os papéis brasileiros mais atrativos, aumentando juros, para captar investimentos maiores que cubram a despesa planejada.


E assim, chegamos ao ponto crucial da questão: é o desequilíbrio das contas públicas que está fazendo com que as autoridades monetárias busquem aumentar a Selic. A inflação de demanda (inexistente em patamares relevantes) não passa de um bode expiatório.

Curtas



1) A Espanha vai ferver como a Grécia. Os funcionários públicos do país terão redução de 15% nos seus salários; quem quiser ter filho não vai mais contar com o apoio financeiro do estado; e a aposentadoria parcial está em vias de acabar. O difícil de perder o juízo não é o fato de ficar louco, mas sim o de recuperar a razão e ter que consertar as maluquices feitas.

2) Os EUA, aparentemente, saíram da recessão. O país cresceu 2,8% no primeiro trimestre, enquanto a União Européia continuou em baixa, com minguados 0,2%. O outro lado da moeda: o déficit comercial norte-americano de março fechou em US$ 40,4 bilhões, o que é o maior prejuízo das contas externas desde dezembro de 2008. Se isso explica o crescimento, também evidencia que o país não aprendeu suas lições coma crise. Se os EUA não se re-industrializarem estarão correndo o risco de perder a hegemonia econômica global e muito mais...

3) Sinceramente, talvez fosse melhor para o Brasil e Argentina dar, finalmente, um basta nessa encrenca do Mercosul. Se o país vizinho não pára de tentar criar barreiras para os produtos brasileiros é óbvio que as condições de integração não existem. Melhor ficar solteiro flertando com quem agradar, do que insistir em um casamento completamente neurótico, imposto por uma questão de vizinhança e não de afinidade.





quarta-feira, 12 de maio de 2010

A Inflação da Bobeira

Assuntos não faltam para brindar o retorno desse blog à ativa.

Na difícil escolha do tema central para o recomeço das atividades do Relatório Econômico, decidimos optar pelo enfrentamento do maior trauma da economia brasileira: a inflação.

Depois do sucesso do Plano Real, tivemos a vantagem de não precisar conviver diariamente com altas exacerbadas de preços.

Pelo lado negativo, somos obrigados a engolir a política monetária mais medrosa do mundo.

Há alguns dias, o COPOM decidiu aumentar a SELIC em 0,75 ponto percentual por causa da aceleração inflacionária verificada no primeiro quadrimeste de 2010. De fato, quando os preços aumentam acima de 0,4% a situação merece atenção especial. E entre em janeiro e abril deste ano, o IPCA, invariavelmente ficou bem acima desse patamar.

Na ilustração a seguir, os principais componentes que compõe o custo de vida dos brasileiros estão destacados, com suas respectivas inflações médias mensais do primeiro quadrimestre.


Os itens em azul referem-se a grupos de produtos onde não há pressões de preços, ou seja, não preocupam. Já os amarelos estão no limite do que poderia ser considerado salutar para a economia brasileira, ou seja, inflação anual abaixo dos 5%.

Finalmente, em vermelho identificamos as pedras no sapato que perturbaram as autoridades monetárias a ponto deles subirem os juros em temporada pré-eleitoral.

Mas vamos analisar esses problemas um pouco mais detalhadamente.

A inflação dos alimentos realmente foi alta. Entre janeiro e abril a variação de preços no setor só não esteve acima de 1% e em fevereiro (0,96%).

Entretanto, deve ser considerado que fenômenos climáticos fizeram com que as chuvas, especialmente no sul e sudeste, fossem recordes, provocando inundações, desabamentos e perdas de safra de hortifrutigranjeiros e cereais. No momento em que a fúria do clima se acalmar, os preços devem recuar novamente, como sempre aconteceu.

As despesas com educação, por sua vez, sempre concentram aumentos em fevereiro, com a temporada de matrículas escolares e compra de material didático. Nos meses seguintes os preços ficam estáveis, ou até caem. Em fevereiro último, a alta foi de 4,53% diante de 4,77% de igual período no ano passado. Ora, se em 2009 o custo do estudo não justificou alta de juros, por que isso foi motivo para mexer na Selic nesse ano?

Finalmente, no âmbito das despesas pessoais, a maior culpa foi do futebol. Afinal, com a repatriação de tantos craques, os campeonatos estaduais, a Copa do Brasil e a Libertadores da América ficaram mais interessantes e caras. O preço dos ingressos aumentou 20,7% no primeiro quadrimestre do ano e as mensalidades sociais dos clubes subiram 6,18%. Afora isso, os despachantes cravaram a faca nos clientes com alta de 6,2%; os cartórios (deveriam ser extintos) com 4,97%; e os empregados domésticos com aumento de 5,37%. Nesse último caso, a alta está associada à melhoria do nível de emprego em geral, o que é natural e desejável.
 
Em resumo, os juros básicos subiram por conta da inflação; e a inflação aumentou por causa das chuvas, das matrículas, do futebol, dos despachantes e cartórios.



Uma proposta: quando as chuvas diminuírem, o custo das matrículas estará diluído nos meses seguintes. Daí, é só expulsar os craques do Brasil, extinguir os cartórios e baixar os juros de novo. Será que essa cola?

Uma suspeita pessoal: alguém importante do governo federal não quer a ministra Dilma Rousseff como presidente da república.

Curtas

1) Gastança muito da demagógica esse negócio de o governo ressuscitar o fantasma da Telebrás para “popularizar a banda larga”. Em primeiro lugar, o tão falado Decreto para entregar R$ 3,2 bi à estatal, aparentemente, é ilegal, pois não está incluído no orçamento da União. Ademais, esse dinheiro que poderia custear cerca de 350 mil casas populares vai provavelmente acabar como qualquer elefante branco: grande parte gasto em consultorias de qualidade duvidosa, salários de executivo e mordomias, enquanto a eventual infra-estrutura construída vai ser entregue a preço de banana a alguma Tele que realmente saiba operar com banda larga.

2) A crise fiscal grega mostrou importante fragilidade da União Européia. Portugal e Espanha também confessaram fortes desequilíbrios e devem ser beneficiados pelo pacote de socorro do FMI e Banco Central Europeu. Muito mais do que barbeiragem e demagogia de políticos gastadores, a situação põe a perigo a própria estabilidade do EURO. Em 2008 os países mais ricos do continente garantiram a sustentabilidade da moeda às custas de endividamentos multibilionários e juros em baixa. Nesse quadro financeiro, qualquer problema de confiabilidade pode ser catastrófico.