sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Não Tem Jeito: O Brasil Está Sim em Recessão

Hoje pela manhã o IBGE causou impacto nos principais portais da Internet, ao veicular a informação de que o Brasil havia deixado para trás a recessão, de acordo com o resultado do PIB do segundo trimestre desse ano. Segundo o Instituto, houve uma alta de 1,9% do produto interno bruto nacional, frente aos três meses imediatamente anteriores.


A questão é que essa é uma medida deturpada da realidade, mesmo que isolada dos chamados efeitos sazonais. Afinal, no primeiro trimestre há a concentração de férias dos trabalhadores brasileiros, além de eventos típicos do verão, como o carnaval, que acabam determinando um menor nível de produção no período. Simplificando: sempre a geração de riqueza no segundo trimestre foi e será maior do que nos primeiros três meses do ano.


A linha verde da ilustração a seguir mostra exatamente isso. Eventualmente pode-se destacar o aspecto favorável de que o ritmo de crescimento da economia brasileira, na abordagem em foco, vem se acelerando desde 2007.

Mas a verdade, na forma mais crua, só é verificada na medida em que comparamos períodos homogêneos. Ou seja, analisamos o desempenho do segundo trimestre de 2009 diante de espaços de tempo idênticos dos anos anteriores.

Nesse caso, como mostra o traço avermelhado (mesmo trimestre do ano anterior) o PIB nacional recuou 1,16%, o que não é um desempenho tão ruim, se comparado como padrão mundial da atualidade, em função da crise financeira iniciada em setembro do ano passado.


 
Sendo assim, politicamente entendo que governo federal errou ao não tratar a questão de maneira mais aberta e franca.



Esclarecida a questão, chamo a atenção do leitor para o próximo gráfico, que mostra a evolução encadeada do produto interno bruto do país. No caso, tanto no enfoque de variação sobre o mesmo trimestre do ano anterior (mais sensível), como na análise anualizada, é possível verificar que desde o final do ano passado o Brasil vem passando por um sério esfriamento da sua economia.

Observando a trajetória recente da linha laranja, é praticamente impossível que o PIB nacional não feche no vermelho na contabilização final de 2009, uma vez que o ritmo de desaceleração é bastante intenso.


Esmiuçando um pouco mais essa rápida análise, no âmbito do setor produtivo a indústria e a agricultura é que acabaram determinando a dinâmica verdadeiramente recessiva do Brasil.


No caso industrial, a retração de 7,94% é o pior resultado das últimas décadas (o IBGE inicia a sua série em 1999, não havendo registro de queda tão intensa), sendo a conseqüência direta da retração do comércio mundial, em conjunto com um contexto cambial francamente desfavorável para as fábricas brasileiras.

Já o recuo da agropecuária foi devido à queda do preço das commodities no mercado global no segundo trimestre do ano, além de adaptações do mercado à nova realidade financeira global, após o enxugamento da liquidez provocado pela crise do crédito.

Por fim, o único setor produtivo a sustentar crescimento foi de serviços, apurando alta de 2,4%. Esse resultado acabou sendo impulsionado, especialmente, por dois aspectos, quais sejam: a elevação de 3,2% do consumo das famílias e de 2,2% dos gastos do governo.

Acompanhando esses movimentos, o setor de intermediação financeira liderou a formação de riqueza do país, com a generosa alta de 8,22%. Em contraposição, o comércio amargou queda de 3,98%.

A comparação desses números deixa fortes indícios de que o aumento do consumo das famílias está mais focado nos serviços financeiros do que na aquisição de bens, propriamente ditos.



Em resumo, por mais que o cidadão brasileiro esteja ansioso por boas notícias no campo econômico, a verdade é que, pelo menos até o fechamento dos dados oficiais do primeiro semestre de 2009, as atividades produtivas do país, predominantemente, estavam enfrentando dificuldades de sustentação.


Ao invés de mascarar essa realidade para novamente aumentar impostos sobre carros, eletrodomésticos e material de construção, o governo federal poderia estar estudando e implementando estratégias de forma a aproveitar as atuais instabilidades do mercado global, em favor da ampliação das oportunidades comerciais para as empresas brasileiras.

Essa agenda deve, obrigatoriamente, incluir aspectos como: desoneração real das exportações; política cambial mais harmônica com a realidade produtiva e do emprego (ao invés de priorizar necessidades financeiras do tesouro); e estratégias diplomáticas mais próximas afeitas à promoção comercial.



Xeretando na Balança Comercial Brasileira




Meio que na surdina, o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio divulgou, hoje, o detalhamento das exportações e importações brasileiras de agosto.

Bem, todos os interessados no assunto devem saber que as exportações do mês chegaram a US$ 13,5 bilhões. Isso representou uma queda de 30% diante de julho; e de 2,24% em relação a agosto do ano passado. Nessa última comparação, o resultado até que está bom, diante do contexto de crise global.

Com relação às importações, elas chegaram a US$ 10,8 bilhões, recuando 38% frente a julho e 4% em relação a agosto de 2008.

Em poucas palavras, o comércio exterior brasileiro manteve, aparentemente, uma situação de tradicional equilíbrio com superávit. Em princípio, nem parece que o país passa por um quadro de grave apreciação cambial.

Mas a realidade não está às mil maravilhas, como aparente. Vejamos alguns aspectos que deixariam qualquer gestor público de negócios internacionais com a pulga atrás da orelha:

1 - Em média, cada quilo exportado pelo Brasil rende US$ 0,33 centavos. Pelo lado das importações, o custo fica em US$ 1,21. Isso quer dizer que um quilo de produto estrangeiro vale cerca de 3,6 quilos de produto brasileiro. Tal perfil não é de se orgulhar.

2 – No mês passado foram importados 6.977 diferentes tipos de itens exportados 5.176, mostrando importante déficit diversificação comercial do país;

3 - Nove dos 10 principais produtos exportados (em ordem de valor) são básicos – agrícolas ou minerais – e representam 41% da receita brasileira com comércio exterior. Pelo lado das importações, sete entre 10 são mercadorias industrializadas. O grupo representa 20,5% das compras internacionais do país. Em resumo falta diversificação em nossa matriz de vendas externas.

4 – Agora, nas relações com os parceiros comerciais, o principal destino exportador brasileiro é a China, que já concentra 13,8% de nossas vendas internacionais. Cada kg exportado para o citado país, rende ao redor de US$ 0,14. Por outro lado, mesmo com um grande coquetel de práticas desleais de comércio, os embarques chineses para o Brasil tiveram, em agosto, o preço médio de US$ 3,43. Por mais que doa, temos que admitir que o quilo de China está valendo quase 25 vezes a mais do que o quilo de Brasil. Tal tipo de relação não era vista nem na época em que nosso país era colônia de Portugal.

5 - E como deve ser essa medida nas trocas com os “gananciosos” norte-americanos? Nosso preço médio de exportação é de US$ 0,65 e o de importação US$ 1,03. Sem dúvida uma relação bem mais próxima do que poderíamos chamar de equilíbrio comercial. Quem é o ganancioso, diante de tal fato?

6 – Outro dado periclitante: de agosto de 2008 até o mês passado, os 10 principais parceiros comerciais do Brasil pularam de 51% para 54% em termos de participação das exportações nacionais. Isso é um temeroso retrocesso, dado o aumento de concentração das vendas em poucos mercados. No caso das importações, a relação piorou ainda mais: os 10 maiores exportadores para o Brasil representavam 56,8% em agosto de 2008 e pularam para 63,5%, de acordo com a última informação disponível.

Em resumo, o que mostram tais dados?


Se por um lado, o Brasil conseguiu reagir, em termos absolutos, no que se refere aos valores exportados e sustentação de uma balança comercial positiva (graças ao agronegócio e minérios), por outro a qualidade de nossas relações comerciais estão piorando a olhos vistos.

Não é só aparente a percepção de que estamos reassumindo a posição de produtor periférico (produtos básicos) que foi criticada por décadas a fio, especialmente, pelos economistas que hoje estão no governo federal.

Evidentemente não condeno o avanço do agronegócio no país. Isso é fundamental para o desenvolvimento, mas não elimina a necessidade de aumentar a competitividade nacional no âmbito das mercadorias com maior agregação de valor, especialmente aquelas com elevada intensidade de tecnologia embarcada, que são, realmente, os produtos mais dinâmicos do mercado global.

Além da deterioração da competitividade industrial, chama atenção os sérios problemas de concentração das relações comerciais em poucos países. Isso gera riscos de dependência econômica e indica que o Itamaraty poderia estar trabalhando melhor e mais pragmaticamente em suas ações diplomáticas.

Melhor começar a pensar mais seriamente nessas questões.


Uma política industrial e de comércio exterior deve ser levada a sério. Senão, o Brasil tenderá a limitar suas ambições em ser a maior fazenda do mundo, com algumas competências específicas.

Isso é muito pouco!

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