quinta-feira, 10 de setembro de 2009

A Inflação Brasileira em Tempos de Crise Global

É sabido que a inflação brasileira permaneceu em patamares baixos desde o início da recessão interna, ocasionada pela crise financeira global. De setembro até julho, o IPCA (IBGE) registrou alta de apenas 3,94%.

Projetando esse percentual para o ano, os preços ao consumidor ficariam restritos a 4,7%, o que está bem dentro da normalidade do padrão inflacionário do país nos últimos tempos. Tocando na mesma tecla da semana passada, a inflação não justifica o congelamento dos juros.

Mas a variação dos preços em questão tem alguns aspectos curiosos, dignos de serem analisados.

Verifique o gráfico abaixo e repare que há grandes diferenças na evolução de preços em cada um dos grupos de produtos que perfazem a cesta de consumo dos brasileiros.

Os segmentos que cresceram acima da inflação média (em vermelho) conquistaram ganho real de preço. Em resumo, a cadeia produtiva ligada a tais complexos de mercadoria tiveram melhoria de margem de lucro. Ao contrário, os grupos com percentual abaixo do Índice Geral, amargaram perda de preço relativo.
Normalmente a grande imprensa - para cair no gosto do senso comum - acaba demonizando os produtos com maior alta de preços. Mas é só perguntar para os repórteres, editores ou donos dos veículos se eles acham que deveriam ganhar mais pelas suas atividades; que ninguém diria que não.


Aparentemente, existe a lei de que a inflação acontece sempre quando os outros sobem os preços... Mas quando o interesse é próprio, o argumento vai para a recuperação do poder de compra, ou justa melhoria de remuneração.


No frigir dos ovos, aumenta os preços quem pode; quem tem mercadoria que continuará a ser consumida, mesmo custando mais caro.


E isso tem muito a ver, por um lado, com a percepção do consumidor da utilidade do produto em cada época, além, é claro da concorrência de mercado e, eventualmente, de políticas públicas.


Esse último fator foi de grande força no setor de transportes, cujos preços só aumentaram 0,26%. Tal resultado foi obtido graças a redução de 8,4% do preço médio dos automóveis novos, por conta da redução tributária do produto. No caso dos carros usados, a diminuição de preço chegou a 15,5%. Os combustíveis também registraram leve desvalorização de 0,71%, o que não comprometeu o lucro da Petrobrás, já que o preço do petróleo despencou mais de 50% no mercado internacional.


Já o segmento de comunicações foi beneficiado pela acirrada concorrência das operadoras de celular. O preço médio do telefone móvel caiu 5,6% entre setembro de 2009 e julho último. Em termos de serviços o avanço ficou em 0,4%. Correios e telefones públicos pressionaram a alta do indicador com variações de, respectivamente, 2,37% e 2,66%.


Bem acima da inflação média, os artigos de despesa pessoal (7,78%) mostraram que nos momentos de crise financeira mundial a célebre palavra de ordem do movimento hippie, “sexo, drogas e rock'n'roll”, é levada às vias de fato. Afinal, o grupo de consumo em foco teve como importantes influências de alta os motéis (7,77%), cigarros (27,51% - na verdade alta do IPI) e instrumentos musicais (11,2%).


Finalmente, vamos destacar nessa análise a inflação de 6,4% do vestuário, onde sapatos infantis (10,69%), chinelos masculinos (12,01%), e jóias e bijuterias (13,94%) pressionaram os preços do setor. Por sinal, nos próximos meses, esse segmento tenderá a ganhos mais expressivos por conta de o governo brasileiro ter definido, ontem, sobretaxar os calçados importados da China como retaliação antidumping (prática desleal de comércio).


Trataremos dos grupos de saúde, alimentação e educação e habitação em outra oportunidade.


A conclusão mais importante da presente análise é que, ao contrário do que seria de se esperar, a inflação não está sendo capitaneada pelos produtos mais essenciais.


Veja que os aspectos que fornecem prazer ao ser humano são os itens que mais se valorizaram (no caso do cigarro, temos o aumento do IPI). E antes disso ser algo moralmente condenável, significa uma qualificação do padrão de consumo, mesmo que eventualmente faça mal à saúde (bebidas alcoólicas, junto com cigarros, tiveram altas significativas de preço).


O importante é superar a subsistência. E se em um período de aumento do desemprego, são os supérfluos que estão ganhando valor no mercado, isso significa que a população está cortando gorduras (excessos) no âmbito das mercadorias essenciais (como alimentos), inibindo maiores altas de preços pela velha Lei da oferta e demanda.


Então, sob esse ponto de vista, o Brasil mostra evolução.


Curtas


1) Dois pesos pesados da economia norte-americana não estão levando fé no real re-erguimento do país. Erik Mankin, Nobel de 2007, defende que Barack Obama aumente ainda mais os estímulos, que ainda são – segundo ele – insuficientes para reativar o consumo estadunidense. Já o ex-presidente do Federal Reserve (o Banco Central dos EUA), Alan Greenspan prevê nova crise econômica com data indefinida e motivada pela “natureza humana”. Pessoalmente, entendo que ninguém sabe muito bem o que está falando quando o assunto é o futuro da atual crise. Melhor deixar o tempo e os indicadores objetivos mostrar o caminho que está sendo trilhado pelo globo.

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