sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O País de Falsa Verdade

Não sejamos cínicos! Negar que contar umas mentirinhas faça parte da vida seria a maior mentira de todas. O mentiroso amador é aquele que bate no peito e diz que só fala a verdade. Uma categoria mais profissional é a daqueles que sabem contextualizar a falsidade com um singelo “não sei mentir”.



O problema é que no âmbito das políticas públicas, por mais que se esconda sujeira embaixo do tapete, as verdades acabam se revelando de forma, normalmente escandalosa. Um caso típico é a gripe suína. As ações preventivas do ministério da saúde se limitaram a propagandas que, inicialmente tranqüilizaram a população, ressaltando a inexistência de riscos.

Depois das primeiras centenas de mortes confirmadas pela doença, começou a moda do álcool gel, das máscaras e outras miçangas de pouca eficácia. O retro-viral para curar a doença só poderia ser receitado por médicos da rede pública, após os trâmites burocráticos de confirmação do diagnóstico do paciente, quando, muitas vezes, já era tarde demais para salvar a vida do adoentado.

No final das contas, o resultado: de acordo com dados do final de setembro, o número de mortos no Brasil em função da gripe suína já havia ultrapassado a casa dos 900, colocando nosso país na liderança do ranking mundial de óbitos por causa dessa doença.

A solução para o problema foi simples: o assunto simplesmente foi banido na grande mídia, aparentemente deixando de existir. Na rua se fala, então, que a situação está melhorando. Entretanto, catando informações pela Internet se descobre casos de mortes nessa semana nos estados da região sul, Rio de Janeiro e outras várias localidades do país.

O mais intrigante é que essa maneira de o poder público lidar com seus problemas não é algo circunstancial. Isso já faz parte do dia-a-dia da vida brasileira, vindo à tona de vez em quando.

E aproveitando a ocasião, vale a pena dar uma olhada nos dados divulgados pela pesquisa do IDH (índice de desenvolvimento humano), de autoria do PNUD.

Os jornais destacaram que o Brasil permaneceu na 75ª posição em 2007, dentro de um ranking que envolve 182 países. Ou seja, nossa posição é claramente intermediária entre a miséria absoluta e a riqueza. Países que nos fazem sentir dó, como Peru e Equador, estão em situação similar a brasileira.

Os argentinos, mesmo com todos os problemas internos, apresentam um desenvolvimento humano 6,5% superior ao nosso. E não adianta a seleção do Dunga dar uma surra no time do Maradona. O desenvolvimento humano no país vizinho é melhor e fim de papo.

Mas vamos pensar a questão sob outro ângulo. Nenhum país é culpado por ser miserável. Por outro lado, é inegável a culpa das nações resistentes a evolução.

E nesse âmbito, olha só que dado interessante: no decorrer desta década, o IDH do Brasil evoluiu 2,9%, enquanto a melhoria da média mundial ficou em 5,7%. Somos um país de terceiro mundo que evolui ao ritmo de nações com quase todos os problemas sócio-econômicos resolvidos, como Itália, Espanha e outros de alta renda.

Os dados determinantes para o avanço tão medíocre: a renda per capita do brasileiro cresceu 14% no decorrer da presente década, enquanto a mundial (média linear) avançou 26,5%, ou seja, quase o dobro; o índice global de expectativa de vida aumentou 4,7%, enquanto nosso país ficou abaixo da média, com 4,4% (junto com o Senegal).

Mas o pior ficou para o índice educacional: o Brasil registrou evolução de apenas 1,65% frente a 8% da média mundial. E nesse campo, mais uma bomba que reflete a falta de seriedade dos serviços públicos: o Brasil é o 100º país do ranking de alfabetização.

Ou seja, o nosso grandioso país, afora alguns anos de boas exportações do agronegócio, mostra pouca capacidade de enriquecer, sequer dentro dos padrões mundiais. Além disso, fica evidente que arrecadar tanto e gastar apenas 22% do orçamento em saúde e educação (dados de 2007) é simplesmente fazer nossa sociedade se perpetuar no passado.

Seria compreensível que uma nação com território desértico, ou em conflitos freqüentes tivesse dificuldade para gerenciar um ritmo razoável de desenvolvimento. Mas certamente esse não é o caso de Brasil.

Ou melhor, é sim. Mas o clima desértico e os conflitos estão na cabeça da maioria de nossos administradores públicos.

Sob a areia daqueles cérebros estão engavetadas providências fundamentais para a base de crescimento do país. E a mesma massa encefálica prioriza estratégias de destruir a obra dos oponentes, ou esconder o que não foi feito.

E assim vamos levando a vida. Os jornais destacaram que o desenvolvimento humano brasileiro melhorou. Fazer o que? Vivemos em um país onde a verdade é apenas uma conveniência.

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