sábado, 15 de agosto de 2009

O Fim dos Juros em Queda

Como reação à crise global, desde janeiro o Banco Central do Brasil – a exemplo do que Japão, EUA, União Européia e outros países começaram a fazer mais cedo – iniciou um gradativo processo de redução da taxa básica de juros – a Selic.

Até o momento, a queda foi de 5 pontos percentuais, o que fez nosso governo cair da posição de primeiro para quinto maior pagador de renda financeira do mundo.

Não dá para dizer que tal posição seja lá muito honrosa, mas é inquestionável que o dado em questão representa uma melhoria.

Entretanto, também é verdade que consumidores e empresários têm pouco uso-fruto de tal avanço, já que o custo interno de captação do crédito ainda é bem acima da média mundial.

Esse mérito, por enquanto, vamos deixar de lado. O título desse artigo indica ao leitor que os juros (Selic) devem parar de cair no Brasil e isso não pode ser falado em vão; precisa ser justificado.

Então, vamos ao trabalho.

Tecnicamente, os bancos centrais se permitem reduzir juros quando alguns aspectos conjunturais são convergentes, quais sejam:

1) Atividade econômica em queda: isso é plenamente comprovado pelos dados da produção industrial do primeiro semestre, se comparados com igual período do ano passado. O aumento do desemprego no espaço de tempo em foco também comprova a retração produtiva;
2) Inflação sob controle: lógica aristotélica, em princípio. No momento em que a produção cai, isso significa que os produtos vendem menos, estando provavelmente estocados. Esse excesso de oferta evita que os preços subam;
3) Confiabilidade dos papéis da dívida: não conheço ninguém que não tenha um conhecido meio caloteiro. Emprestar para o sujeito tem grandes chances de ser uma roubada. Quem eventualmente se aventura a isso tenta cobrar o máximo de juros possíveis para que o risco possa valer a pena. Com países, a situação funciona do mesmo jeito. E como o Brasil até recentemente estava com suas contas públicas de dar gosto (superávit), o risco de calote diminuiu, o que repercutiu na queda da remuneração dos títulos da dívida federal;
4) Finalmente, conta também a situação do mercado de títulos públicos entre os diversos países. Com a queda dos juros a praticamente zero nos EUA, Japão e União Européia, quem quiser tirar um troquinho via aplicação financeira vai optar por colocar dinheiro em países de segunda grandeza em termos de confiabilidade, como o Brasil. Dentro desse quadro o Banco Central até pode baixar seus juros que ainda assim a remuneração tupiniquim continua sendo bem compensadora diante do que o mercado global oferece.

O problema é que a partir de agosto, alguns elementos instigantes começam a se movimentar na conjuntura econômica. Vamos a eles:

1) iniciam os movimentos dos negócios voltados para as festas de final de ano. A atividade industrial tende a aumentar sazonalmente. Em média, no decorrer dessa década, a produção das fábricas brasileiras no segundo semestre foi 8% superior ao do primeiro. No comércio essa vantagem da metade final do ano chega a 12%. Tal contexto deixa fácil prever a queda da taxa de desemprego. Mas atenção: tais dados não significam recuperação da economia, mas sim aspectos favoráveis centrados tradicionalmente na segunda metade de cada ano. E com mais produção e emprego, os gastos tendem a aumentar, gerando risco inflacionário. Baixar juros nesse contexto vai contra os manuais operacionais dos bancos centrais.

2) A comprovação do efeito inflacionário: no espaço de tempo em estudo (atual década) a inflação média mensal do primeiro semestre foi de 0,54%, de acordo com o IPCA-IBGE. Na segunda metade do ano a variação média de preços ficou em 0,59%. Essa diferença aparentemente pequena é relevante na sua relativização. A alta de um período para outro fica em 8,9%, o que é preocupante para os padrões das autoridades monetárias, apesar de ser o esperado.

3) Outro aspecto que deve pesar no segundo semestre é a provável diminuição da credibilidade dos títulos da dívida brasileira. Afinal, com a arrecadação de impostos caindo sem que as despesas de custeio da máquina pública sigam o mesmo caminho (na verdade continuam crescendo), o fantasma do déficit das contas nacionais volta a ter força de assombração. Diminuir juros nesse ambiente é praticamente pedir para que os investidores peguem seu dinheiro de volta.

4) Por fim, mesmo que tênues, alguns sinais mostram indícios de recuperação do consumo norte-americano e europeu. Se isso se confirmar, os juros nesses países tendem a gradativamente sair do zero; e os países voltam a ter atratividade de capital. Afinal, as nações ricas queimaram quase todas as suas fichas para evitar uma depressão maior do que a que está ocorrendo. Isso significou avanço do endividamento e conseqüente necessidade de captações adicionais. Então, no médio-longo prazo, os juros internacionais deverão subir, competindo com a taxa de remuneração dos títulos brasileiros. Nesse cenário, é praticamente impossível quedas continuadas na SELIC; o movimento tende a ser o oposto.

Feitas essas considerações, tenho a certeza de que deixei alguns leitores com humor alterado para pior. Fazer o que? Mentir?

Mas se alguém me perguntasse: Isso precisa ser assim? A resposta seria um sonoro NÃO!

Não dá para esquecer que os juros brasileiros são fruto de uma prodigalidade com o uso de recursos públicos. O excesso de empreguismo e muitos programas assistenciais estéreis, sob o ponto de vista do desenvolvimento da cidadania, acabam por jogar no lixo centenas de bilhões de reais retirados de cidadãos e empresas contribuintes. E a carga fiscal continua a subir!

Solução existe: cortar custos de forma a erradicar o déficit público. Daí se pode trabalhar de forma melhor a dívida pública, impostos e outras variáveis que atrapalham o desenvolvimento brasileiro.

O problema é que há pouquíssimos políticos com coragem suficiente para contrariar as corporações interessadas na manutenção desse status-quo. Mais raro ainda é pinçar uma dessas pessoas públicas responsáveis que tenha chegado a chefiar um executivo municipal ou estadual (nem vale a pena falar do federal). E desse raríssimo substrato talvez não dê para contar nos dedos de uma mão (por excesso e não falta de dedos), os que fizeram isso e não foram ou não estão sendo politicamente incinerados pelos seus opositores.

Isso lembra a história da francesa Joanna D’arq. Só foi reconhecida como salvadora da França depois de virar cinzas.

Talvez, no Brasil, não precisemos chegar a tanto. Mas talvez sim...

Eduardo S. Starosta

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